A educação é um processo e uma realidade que faz parte da vida de todos os sujeitos sociais. Ensinar e aprender, aprender e ensinar faz parte do cotidiano de todos nós que constituímos a espécie humana, seja na escola, em casa, no trabalho, na rua, com os amigos, colegas, familiares.
O conhecimento humano é diverso e quase infinito, como disse Schopenhauer certa vez: ele se espalha para todos os lados a perder de vista, de modo que nenhum indivíduo tem a capacidade cognitiva/intelectual de apreender sequer a milésima parte daquilo que é digno de ser apreendido.
O saber humano e as suas diferentes manifestações
Existem vários tipos, formas e níveis de conhecimento: o científico, o empírico, o metafísico, o teológico e entre outros. Todos exercem um papel e uma importância no nosso processo de formação humana. Ensiná-los e aprendê-los é uma das formas de educação.
A educação, no entanto, não se restringe só ao processo pedagógico ensino-aprendizagem de conhecimentos científicos teóricos, mas também ao ensino-aprendizagem de práticas populares, costumes, tradições, valores, normas de condutas, comportamentos seculares transmitidos de geração a geração por povos de várias partes do mundo, enfim também diz respeito às diversas culturas que são reproduzidas ao longo dos séculos e constituem a diversidade de conhecimentos, modos de ver, vivenciar e sentir o mundo, a natureza, a sociabilidade humana.
Todo conhecimento é cultural e expressa o modo de se organizar politica, social e economicamente de um povo, uma comunidade, uma nação.
O conhecimento de um político chinês provavelmente não teria tanta importância e utilidade para um indígena do Estado do Acre no norte do Brasil.
O conhecimento e a educação são, portanto, funcionais para reproduzir e perpetrar o status quo de uma determinada sociabilidade, de um determinado modo de produção ou forma de organização social, situada historicamente no decurso da humanidade.
Capitalismo e educação
Sob a égide do modo de produção capitalista o conhecimento científico atingiu o seu auge e continua a se expandir e ampliar. A ciência avançou como nunca, o desenvolvimento tecnológico, a descoberta de novos meios de produção, de novas máquinas e instrumentos de alto nível tecnológico na área da saúde, da educação, da segurança, da agricultura e pecuária emergiram expressivamente.
Porém, o seu domínio e uso estão restritos a uma minoria dominante e os demais sujeitos só os acessam, majoritariamente, através do mercado de compra e venda de mercadorias, ou seja, do mercado de consumo.
Meios pelos quais o conhecimento é transmitido
A educação é o meio pelo qual os povos se utilizam para transmitirem seus conhecimentos, suas crenças, seus valores e princípios, seus códigos e normas de conduta, sua religião, a forma e os meios que o artesão utiliza para produzir os objetos necessários a sua comunidade, como o engenheiro elabora uma planta de uma residência ou de um prédio comercial, como o médico desenvolve e realiza uma cirurgia complexa e delicada num paciente, a maneira como o mestre educador transmite o seu conhecimento para os seus discípulos, aprendizes, alunos e/ou educandos.
Enfim, a educação representa tudo aquilo que viabiliza a construção e o desenvolvimento do ser humano enquanto espécie pensante, inteligente, teleológica e racional.
O mundo e as sociedades que o constituem são espaços e meios de ensino-aprendizagem. Este processo não é e nem deve ser resumido só aos espaços institucionais oficializados como de transmissão do saber, como as escolas e universidades.
Aprendemos e ensinamos no seio familiar, na interação com os adultos, crianças e idosos. Todos ensinamos e aprendemos, cotidianamente, num processo mútuo, mesmo que não percebamos e tenhamos consciência disso.
As instituições de ensino, públicas ou privadas, expressam, ainda que ocultamente ou implicitamente, interesses políticos de classe, ou melhor, daqueles que a desenvolveram para atender os seus interesses particulares e escusos, isto é, atender os interesses do mercado de trabalho. Afinal de contas, a tendência atual, nos marcos da sociabilidade capitalista, é formar “mercadorias” especializadas em determinadas áreas de produção e conhecimento, isto é, formar tecnicamente força de trabalho para atender as demandas e necessidades de desenvolvimento e expansão do mercado capitalista, a fim de garantir as condições necessárias para a sua reprodução e ampliação da sua lucratividade e produtividade.
Quem domina e explora está pouco preocupado com uma educação popular revolucionária que forme sujeitos pensantes, crítico-reflexivos que compreendam a realidade em sua totalidade apreendendo os processos sociais não na forma como eles se manifestam imediatamente, mas como se constituem em sua essência.
Ao contrário, este modelo de educação é abominado e combatido por aqueles que querem se manter na condição de dominadores donos do poder. Por isso que a educação que é ofertada pelos poderes públicos, ou melhor, pelo Estado burguês aos subalternos, desprovidos de quase tudo o que é produzido coletivamente, é uma educação romantizada, alienante e alienadora, tecnicista, fragmentada, aligeirada, pragmática, que encobre e oculta os fatos e fenômenos históricos em sua essência evidenciando apenas a sua aparência.
Sociabilidade capitalista: valores e relações sociais
Vivemos numa sociedade fruto de uma construção histórica e social permeada por costumes, crenças e valores, em sua maioria, preconceituosos, discriminadores e excludentes, como o machismo, o patriarcalismo, o sexismo, a misoginia, a homofobia, o racismo, a xenofobia e uma série de outras formas de preconceito, estereótipos e discriminação.
A construção e reprodução desses valores, ideologias e ideias se processaram através da educação e o seu rompimento e combate também se efetivam através de um processo educativo emancipador, revolucionário e anticonservador no sentido de mudar o pensar e o agir coletivos.
Tudo o que aprendemos desde criança faz parte da cultura que nos envolve. Cada sociedade desenvolve seus modos próprios de viver, de se relacionar entre si e entre a natureza. Nos marcos da sociabilidade patriarcal somos “educados” e ensinados a se comportar conforme os papeis e funções sociais que nos são atribuídos e cobrados pelo consenso da coletividade, consenso este que se perpetua mesmo que contra a vontade de alguns sujeitos.
Mulheres e homens, crianças e adultos, novos e velhos, negros e brancos “devem” seguir e se comportar conforme a sociabilidade do seu grupo social, de acordo com os comportamentos e condutas morais, religiosas, políticas e sociais que, no entanto, variam conforme a sua posição socioeconômica e política dentro da ordem estabelecida vigente.
Numa cultura indígena, assim como em outras culturas, os sujeitos variados e diferenciados por faixa etária e gênero são ensinados a agir por modos de ser específicos que os distinguem dos demais.
A sociabilidade humana não é, portanto, uma construção da natureza, mas uma construção do próprio homem em conjunto. Se este modelo de convivência não condiz com um mundo humanizado, digno, onde todos possam desenvolver suas potencialidades e capacidades de forma igual e livre, outro modelo pode ser por este mesmo homem construído.
Todavia, este processo não é tão simples e fácil como muitos desejam, é, ao contrário, um processo lento, gradual e a longo prazo, e os seus efeitos só surtirão num futuro talvez distante e longínquo, ou não. Como disse, pois, séculos atrás, o brilhante pensador Karl Marx a sociedade humana está em constante transformação e mudança, nada é estático, tudo muda, tudo evolui ou retrocede.
A história, passada e presente, da humanidade, foi e é dinâmica, foi e é construída, reconstruída, produzida, reproduzida, desconstruída e deslegitimada num processo dialético sem fim.
A apropriação do conhecimento ao longo do tempo. A quem pertence o saber?
Os tipos de educação e conhecimento são apropriados e transmitidos aos sujeitos sociais de forma, grau e níveis diferentes, conforme a sua condição e status social. A educação e o conhecimento não são infelizmente apropriados por todos de forma igualitária. Nem todos os sujeitos têm acesso a uma educação de qualidade, seja tecnicista ou emancipadora. Na divisão social e técnica do mercado de trabalho e consumo capitalista, por exemplo, assim como em outras formas antepassadas de sociabilidade, o conhecimento é apropriado e reproduzido desigualmente entre os sujeitos que constituem as classes sociais, isto é, uns servem ao sistema para pensar outros para produzir, uns desenvolvem o trabalho manual-técnico-produtivo outros desenvolvem um trabalho intelectual de planejar os processos da produção e a elaboração dos seus meios.
Conclusão
Mas, afinal, o que é educação? É tudo o que já foi até aqui expresso e analisado e muito mais do que isso. É o processo pelo qual o ser humano se torna um ser social, adaptado a sociabilidade do seu grupo social e étnico-cultural. É o meio pelo qual desenvolve todas as capacidades, potencialidades físico-corporais e cognitivo-intelectuais à sua espécie inerentes por natureza.
No entanto, a educação oficial e institucionalizada, expressa nas escolas e universidades, a fim de atender aos interesses capitalistas, está cada vez mais sendo tirada do âmbito de responsabilidade do Estado e sendo transferida para a esfera do mercado privado de consumo, tornando-se uma mercadoria como outra qualquer.
Como já venho ressaltando, o conhecimento e todo o arsenal de ideias, ideologias, culturas, tradições, valores e princípios, saberes etc, que o constituem, são fruto de construções históricas e expressam o modo como os sujeitos se organizam e se organizaram ao longo dos tempos.
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