Autor: José Lins do Rego
Gênero: Romance/Literatura Brasileira
Edição: 88ª
Editora: José Olympio
Ano: 2001
Páginas: 158
Carlinhos
perdera a mãe quando tinha ainda quatro anos de idade. O pai a matara com
tiros. Ingênuo e inocente não compreendia a situação, apenas chorou
copiosamente. Seu pai fora internado num asilo vitima de uma loucura que não
lhe explicaram direito.
Fora
levado pelo seu tio Juca para morar no engenho do seu avô materno, o José
Paulino, um coronel rico dono de grandes latifúndios. Ao chegar todos ficaram
surpresos com a sua aparência semelhante a da mãe. Passou a ser ciado como
filho pela sua tia Maria, pela qual despertou um sentimento de amor maternal.
No
engenho logo fez amizade com os seus primos mais velhos. Ficou maravilhado com
as belezas e imensidão do engenho. Gostava de tomar banho de rio, brincar de
soltar pião, pipa, pegar e cassar passarinhos nas matas ao redor. Tudo parecia
um paraíso. Sua prima Lili parecia mais um anjo do que gente de tão pálida e
amável. Certo dia morreu o deixando muito triste, pois gostava muito dela.
Sua
tia Sinhazinha era uma velha rabugenta que não gostava de ninguém e ninguém
gostava dela, afinal vivia judiando e descompondo a criadagem do engenho. Um
dia levara uma peia de chinelo dela por jogar o pião em seus pés. Ficara com
ódio da velha com vontade de se vingar.
Costumava
visitar com o avô as suas propriedades imensas ficando sempre encantado com as
novidades deste mundo tão diferente de tudo o que já vira na vida. Também fazia
visitas com os primos e a tia Maria aos engenhos vizinhos onde moravam
parentes. Iam de carro de boi ou a pé brincando no caminho.
Com
os primos fazia peripécias proibidas pelos mais velhos, como tomar banho na
água escaldante do poço. Eles faziam todo tipo de traquinagem e não adoeciam.
Carlinhos, porém adoecera uma vez de bronquite asmática e ficara preso em seu
quarto vendo solitariamente as diversões dos amigos. Fora proibido de sair para
não receber mormaço ou sereno.
Amava
ouvir as histórias de Trancoso da Sr. Totonha, uma velha inteligente para
inventar histórias fantásticas de fadas e princesas, lobisomens, fantasmas,
mula-sem-cabeça e de outras personagens conhecidas por todos. Tinha um medo
descomunal da noite imaginando serem reais as histórias fictícias da velha.
Presenciara
fatos marcantes no engenho como cheias incríveis que arrastaram casas inteiras,
mataram pessoas e animais, destruíram plantações e várzeas completamente. Quase
tudo fora alagado. Alguns sobreviventes foram salvos a canoa nas casas
localizadas em regiões mais altas, inclusive a família de seu avô. No rio
banhado por águas barrentas passavam de um tudo boiando, desde móveis destroçados
até carcaças de animais.
Despertara
a sua vida sexual precocemente influenciado pelos primos e moleques libertinos
e promíscuos. Era aliciado por uma negra da fazenda ainda criança. Deixava se
entregar aos prazeres mundanos e a vida da libertinagem. Aprendera com os
amigos da bagaceira a praticar atos libidinosos até com as vacas. Seu professor
de leitura e escrita o ensinara coisas de adulto, contara suas aventuras de
homem com algumas negras que após a escravidão ainda eram objetos de satisfação
sexual dos senhores de engenho e dos demais homens. Vira no quarto do tio Juca
fotografias de mulheres peladas e sentia um desejo incontrolável e estranho,
porém prazeroso. Acabava se masturbando. Seu tio o pegara certa vez no flagra e
proibira a entrada no quarto sem sua permissão.
Aos
doze anos perdera sua castidade de criança, sua virgindade com uma negra da
fazenda que era objeto de prazeres de muitos homens. Acabara sendo contagiado
por uma doença sexualmente transmissível. Quando todos souberam sofreu várias
formas de pilhéria e chacota. Passou a ser tratado como gente grande. Não mais
interrompiam as conversas quando ele chegava. Tomou diversos remédios caseiros
de ervas medicinais. Sentia-se adulto se gabando da sua doença como se esta o
amadurecesse. Sentia-se um adulto em corpo de criança, porém ainda era
inevitavelmente uma criança.
Quando
sua tia Maria se casara e fora morar em outro lugar perdera uma segunda mãe
para o destino cruel. Chorara muito. No dia do casamento preferiu não
participar da cerimonia, foi chorar em seu quarto. A festa foi de arromba.
Tinha gente de todos os cantos. A casa ficou lotada e com muito movimento de
gente que não parava de conversar e andar num vai e vem infinito. As crianças
corriam e brincavam alegres com as boas novas que não ocorriam com tanta
frequência. Era muita comida, música e dança. Vinham a cavalo, a pé e de carro
de boi.
Meses
depois é internado num colégio. Despediu-se de todos com pesar e tristeza no
coração. Apesar das saudades que iria sentir das brincadeiras com os amigos,
dos banhos de rio e açude, da prima do Recife pela qual se apaixonara e de
todos do engenho, se alegrava ao saber que iria conhecer novos amigos no
internato, que se tornaria um homem de prestigio e caráter, como todos falavam
do internato como corretor de meninos, iria deixar sua mãe feliz ao se tornar o
que ela sempre desejou. Sua diferença para Sérgio, o personagem garoto de o
Ateneu de Raul Pompeia, era que ingressara no internato sem inocência, já sabia
de quase tudo, enquanto Sérgio era uma criança ingênua, inocente e
desprotegida. Fora desgarrado do seio familiar e lançado nas garras cruéis do
Ateneu sem nenhuma experiência de vida. Carlinhos conhecia um pouco do mundo da
libertinagem e das façanhas humanas, apesar da pouca idade.
Autor: Marcondes Torres.
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